Pho-dah-c – Flávio Karras

“Meu nariz e minha boca inchavam.
Orelhas se esticaram ao além.
Sou ódio
puro.
Reduzido e
ampliadho.”

Em uma pequena cidade do interior de São Paulo, mais precisamente Araraquara, três desconhecidos medíocres têm suas vidas mudadas por um ser mítico: o pischeromem, uma criatura metade homem, metade pinscher, 100% ódio e tremedeira. Essa é a premissa de Pho-dah-c, o novo livro do escritor paulista Flávio Karras, lançado em 2024 pela Rocket Editorial

A história se inicia com um date de Francisco, um jovem bancário sem atributos memoráveis, com um apetite sádico e que se autodefine como “100% ódio”. Ele conhece pessoalmente Beethoven, um homem de poucas palavras com um problema sutil de phala fala, que por acaso também é irmão de sua ex-namorada, Belinha. Depois de um pouco de conversa, os dois resolvem ir para o rala-e-rola e é quando Francisco leva a fatídica mordida de um pinscher. Ele não sabe, mas está prestes a se tornar um pinscheromem. 

Em seguida, conhecemos mais um personagem: Domingos, um idoso avarento e extremamente tóxico, esquecido pelos filhos homens, que destrata tudo e todos ao seu redor, especialmente sua filha Marina, a única pessoa que realmente se importa com ele. Domingos está prestes a perder sua casa, então decide ir ao banco para que a dívida seja definitivamente acertada. É quando seu destino cruza com Francisco. 

Por fim, o leitor é apresentado à terceira personagem: Lívia, uma jovem recém saída da adolescência, uma youtuber de maquiagem que se apresenta em lives vazias. Ela mora na periferia de Araraquara, sua mãe vive ausente por ser escrava empregada de uma família de ricaços. A jovem vive com o pai, um ex-policial, sua irmã adolescente, e seu periquito Magno, figura que levará Lívia e sua família ao estrelato espontâneo e fugaz das redes sociais. 

O livro tem capítulos escritos em primeira pessoa por cada um dos personagens em um tom corriqueiro e desbocado, com narrativas breves que vão se intercalando.  A história se passa em um curto período de tempo em um ritmo frenético, exalando a mais pura energia caótica, regada a gore e muito humor negro. 

Minhas impreshões: 

Conheci o autor em 2019 com sua coletânea de contos Indigesto e fiquei com vontade de ler o Pho-dah-c assim que vi sua sinopse. Embora não seja dividido em partes, a primeira metade tem um tom bem cômico, é difícil passar uma ou duas páginas sem dar pelo menos uma risadinha.

É na segunda metade que podemos dizer que “a porra toda fica séria”, já que a violência escala a altos níveis com bastante gore, sem deixar de lado o humor ácido, claro. A leitura é ágil e o ritmo é frenético, como mencionei antes, o que por um lado é ótimo, já que o leitor não tem nem tempo de cansar ou ficar entediado, mas por outro lado acabou deixando um ponto negativo, já que algumas cenas com os pinscheromens poderiam ter mais descrições e detalhes. 

No mais, a experiência no geral foi bem positiva, me diverti horrores. Os personagens são pessoas comuns, todo mundo conhece um sujeito como Francisco, ou um velho desprezível como Domingos, e em cada esquina vemos uma Lívia fazendo absurdos em seu desespero pela fama. Embora a figura do pinscheromem seja fictícia, o ódio e tremedeira que regem a sociedade moderna são bem reais, e essa é a crítica certeira de Flávio Karras. 

E quero declarar que sou 100% a favor do pinscheromem entrar oficialmente para a mitologia de Araraquara. Para quem não sabe, moro na cidade vizinha e vez ou outra dou uma passada pela Morada do Sol. Aliás, essa questão da proximidade, de ler histórias em cenários familiares, para mim é uma experiência sensacional. 

A primeira edição de Pho-dah-c está disponível em capa comum no site do autor, e em breve uma nova tiragem será lançada pela Avec (que adquiriu a Rocket). Notah: ★★★★½

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